sábado, 29 de março de 2008

Tempo

Elas eram melhores amigas, mas como em todo relacionamento, um belo dia, a lua-de-mel acabou. E ela começou a perceber que, há muito tempo, a amiga não ficava feliz por ela, ou sequer tinha algo legal, positivo para falar.


Quando ela trocou de óculos por um par tão perfeito que, para pagar por ele, teve de dividir em 6 prestações, a amiga disse apenas que não havia gostado do desenho. Ficava estranho em seu rosto, fino demais.


Quando ela decidiu remodelar as sobrancelhas com uma moça super recomendada, que usava uma técnica mega alternativa, a amiga disse que tinha deixado os olhos dela pequenos e o nariz imenso. E desde quando ela tinha aquela pinta entre os olhos? De repente os pelos estavam escondendo...


Quando ela criou coragem para cortar os cabelos que já quase batiam na cintura e lançar mão de um corte bem moderno, bem jovem e repicado, a amiga alertou que quase não tinha sobrado cabelo pra cortar.


Quando elas foram jantar porque ela estava super chateada com a partida do seu quase namorado para estudar o comportamento de uma tribo sei-lá-qual sabe-se-lá-onde, enquanto ela chorava sem saber se algum dia alguém ia gostar dela o suficiente para colocá-la acima de tudo, a amiga a interrompeu dizendo que talvez ela não devesse ter cortado o cabelo. E ter comprado lentes, em vez daquele novo par de óculos. E talvez aquele desenho de sobrancelha não tivesse ajudado também... Aliás... Ela tinha alguma coisa entre os dentes?


Quando ela arrumou um namorado, ligou para a amiga toda feliz, avisando que tinha mandado fotos do feriado que tinham passado juntos, para que ela visse quem era, que ela estava doida para apresentá-los. E a amiga disse que ele não era lá muito bonito.


Certo dia, enquanto jantavam num restaurante que ela estava doida pra conhecer e a amiga disse que a comida era meio sem sal, ela disse:


- Te contei que vou tirar férias?


- Mas você saiu de férias do trabalho não tem nem 2 meses, você até viajou com o Túlio.


- É Júlio, mas eu não vou sair de férias pelo trabalho. Eu preciso de férias de você!


E ela tirou a sua parte da conta da carteira, mais uma bela gorjeta para o garçom. Deixou a amiga ali sozinha e, pelo que sei, elas não se falaram por um bom tempo.

quarta-feira, 19 de março de 2008

Convivência...

Num momento de carência, ela pergunta ao namorado...

- Amor, por que você nunca me surpreende?

- Como assim, gatinha?

- Ah, sei lá... O namorado da Paula outro dia fez um jantar pra ela. Ela me contou quando a gente foi ao shopping e eu achei tão romântico...

- Eu adoraria cozinhar pra você, minha linda. Mas é difícil acertar. Uma das primeiras coisas que você me deu foi material de leitura pro nosso relacionamento dar certo. “Coisas que eu não como e a lista das raras coisas que eu realmente gosto de comer”. Lembra?

- Hmm...

- Lasanha Sadia...

- Sem presunto...

- Miojo da Maggi...

- Mas sem aquele caldinho... E só com metade do tempero...

- Só come lanche do Bob’s...

- Agora é McDonald’s...

- Tá vendo?? Agora já vou ter de editar a lista...

- Ah...

- Você quer que eu faça um jantar pra você? Eu pego agora o miojo no armário, mas acho que a lasanha precisa descongelar um instante antes de tirar o presunto... O McDonald’s tem delivery, eu posso ligar...

- Esquece.

- Deixa de ser boba, eu te amo... Deita aqui do meu lado, vem...

- Chega pra lá...

Ele começa a se ajeitar na cama...

- Não, chega pro outro lado. Você sabe que eu não deito do lado da parede.

- Sim, tem isso também... E você sempre fica do meu lado esquerdo quando a gente anda na rua...

- Amor...


- Fala, gatinha...

- Isso te incomoda?

- O que?

- Minhas manias...

- Não, linda. Eu achava você meio esquisita no começo, mas acho que isso te faz especial no fim das contas.

- Ai, que lindo, amor...

- Vem cá, me dá um abraço...

- Tá...

Ele se aproxima para dar um beijo nela. Um beijinho delicado na ponta do nariz...

- Ai, amooor!!! Ecaaaa... Agora eu vou ficar com cheiro de cuspe no nariiiiz... Creeedooo!!!!!!!!

Ela levanta correndo pra lavar o rosto. Ele aumenta o volume da TV e dá uma risada discreta, o Fluminense está jogando.

segunda-feira, 10 de março de 2008

A próxima

Tentar pegar o buquê da noiva em um casamento é um esporte definitivamente radical. E o grau de dificuldade aumenta exponencialmente quando o terreno em que a mulherada se amontoa é fofo, como um gramado.


Equilibrar-se de salto fino na terra macia é tarefa para artistas do Cirque du Soleil. Mais ainda quando várias fêmeas enlouquecidas pela possibilidade de serem a próxima a casar se movimentam do seu lado como jogadoras de futebol americano. Praticamente levantando as saias para aumentar a mobilidade, alongando para prevenir lesões, dando aquela cuspidinha na mão para garantir a pegada. Uma boa estalada no pescoço para ter certeza de que estão preparadas. Pode mandar, noivinha... Pode mandar...


E eu ali parada, minha primeira vez. Sabendo que qualquer movimento brusco resultaria tão somente em um estabaco muito feio, com possível exposição da calcinha. Nem pensar...


A noiva manobra as moçoilas e logo se percebe que há uma favorita para o prêmio. A madrinha, melhor amiga. Imagina que lindo se ela pegar o buquê... Praticamente poético, definitivamente romântico. E ela seria a próxima, e as duas seriam esposas e todos os tralalalas. Sem problemas, eu não pretendia me mexer mesmo...


O cerimonialista vem, mais parecendo aqueles assistentes de palco de programa de auditório, instruindo a multidão sobre como proceder. Contem 1, 2, 3 e a noiva joga o buquê!


1... 2... 3!!!! Aha! Vocês pensaram que ela ia jogar, né? Mas a primeira é sempre de brincadeirinha...


1... 2... 3!!! Agora sim, ela joga o bendito. Como todos sabem, a cena então fica em câmera lenta.


O buquê vem vindo exatamente na direção prevista. As mulheres começam a se movimentar. Esticam os braços. As mãos ansiosas para tocá-lo. O buquê encobre a madrinha e cai perfeitamente... Nas minhas mãos!


A velocidade volta ao normal e duas velhas ensandecidas voam em direção ao buquê, derrubando-o das minhas mãos com um golpe de karate de solteirona que vai ficar pra titia. Flores pra todos os lados, mais mulheres enlouquecidas voando para recolher os restos do buquê que obviamente já era meu.


Então uma das minhas amigas levanta o troféu, mas o entrega novamente a mim. Todos viram a cena perfeita de cinema que o conduziu às minhas mãos. Até o momento de desespero extremo das senhoras não casadas.


Foto com a noiva. Eu e a amiga que resgatou o buquê do chão. E o dito cujo, claro.


Volto eu para o restaurante com o que restou do que minutos antes era, ainda, um belo montinho de flores. Só para ouvir o cerimonialista dizer que eu tinha a mão furada.


Então eu peguei o que havia sobrado das flores e enfiei na boca dele, pra aprender a não mexer com a pessoa errada...


Mentira... Fui direto pra minha mesa tentar conseguir uma água. Eu precisava repor as energias...