quinta-feira, 19 de setembro de 2013

A caneca

Vinicius entrou em casa pra encontrar Mariana sentada num canto do sofá, aos prantos.

- Amor? Ce tá bem?

- Eu - soluço - nãããããããããão!!!! - agudo.

- Calma, Mari! O que aconteceu?

- Eu - mais soluços - iiiiiiiiiiiiiiiiih - ruído incompreensível.

- Respira. Calma. Respira.

Mariana respirou. Tomou fôlego. Quinze minutos depois, já aconchegada no peito de Vinicius, declarou:

- Eu quebrei sua caneca.

- Minha...

- Ai, amor, eu tava lavando a louça e fui mexer na pilha que você deixou no canto da pia e eu já liguei pra minha mãe e...

- Pera. A caneca que meu pai me deu?

- É, deixa eu terminar de arrumar a mala.

- Mari, senta. Pra que você vai arrumar mala?

- Eu vou ficar na mamãe, eu quebrei sua caneca.

Vinicius riu.

- Cara, você acha o que? Que a gente vai brigar? Que eu vou, sei lá, TERMINAR com você?

- Você amava a caneca.

- Mas eu amo você bem mais.

- Awn. Você não tá bravo?

- Não. Eu tô PUTO. Tô puto pra caralho. Mas, cara. Era uma caneca, sabe?

- Ai, amor, desculpa. Te amo, eu tava tentando fazer uma coisa bonita, legal, só fiz merda.

- Tranquilo. Mas por que você tava lavando louça?

- A Lurdes não veio. Disse que o neto tava com dor de dente.

- Entendi. Bom. Talvez seja interessante comprar uma máquina de lavar, hein?

- Ai, jura? Eu até vi umas tão legais na internet...

- Depois manda o link. Vamos ver o preço.

- Tá!

Vinicius se dirigiu à cozinha, pra avaliar o estrago, se despedir da caneca, essas coisas.

- Amor?

- Oi!

- Você me trouxe flores.

- Trouxe.

- Por que?

- Como assim por que?

- Não é data especial, não é meu aniversário, nem aniversário de namoro, nem nada demais.

- Ahm.

- O que você fez?

- Como?

- O que você fez?

- Mariana, você realmente tem a cara de pau de sugerir que eu teria te trazido flores pra encobrir alguma coisa errada? Qual o seu problema?

- Você nunca me dá flores, Vinicius. Coisa boa não deve ser.

- Quer saber, Mariana? Eu vou dar uma volta.

- Mas você acabou de chegar.

- Pra você ver. Tchau.

- Amor?

- Que? - Perguntou já com a porta aberta, um pé fora de casa e o outro prestes a seguir.

- Eu tô sem calcinha.

- Tem um vinho na geladeira, pera. Vou abrir.

Vinicius fechou a porta e foi lamentar a caneca quebrada.

Ou quase isso.

quarta-feira, 11 de setembro de 2013

Aniversário

- Um ano já.

Ela comentou como se fosse nada.

- Um ano? - Ele beijou-lhe o pescoço. - Verdade. Um ano...

- Passou rápido, né?

- Passou. Quem diria...

- Bom, eu diria. Eu soube desde o primeiro dia.

- Soube?

- Sim, desde aquele café. Na hora em que você cheirou meu cabelo eu soube que ia me apaixonar por você. E que você era o cara.

- Eu não cheirei seu cabelo.

- Tá.

- Sério.

- Tá.

- Tá, eu cheirei seu cabelo. - Disse afundando o rosto em seu pescoço pra repetir o momento. - Você tava tão cheirosa aquele dia. Que nem agora.

- Eu sou cheirosa.

- Eu sei.

- Mas como eu dizia, eu sempre soube.

- Eu tive minhas dúvidas.

- Hein?

- Eu jurei que a gente fosse dar errado.

- Jurou que a gente fosse dar errado? Como assim? Quando?

- Ah, lá no comecinho. A gente era muito diferente. É muito diferente.

- Diferente em que?

- Em muita coisa. Em tudo. Sei lá. Eu achei que fosse dar errado.

- Me dá um exemplo.

- Para, cara. Não vem ao caso.

- Como assim não vem ao caso? Você achou que a gente fosse dar errado!

- Mas isso foi lá no começo. Bem no começo. Tem um ano já, cara. Deixa isso pra lá.

- Claro, deixa pra lá. Eu aqui contando uma história desse relacionamento e você me diz que não é nada disso.

- Hein?

- Ah, eu sempre achei que tivesse sido amor à primeira vista, arrebatador, blablabla. Você sabe a história. Eu conto o tempo todo.

- Mas foi assim. Eu me apaixonei por você desde o café. Desde o dia em que eu não cheirei seu cabelo.

- Aham.

- Foi sim. Eu só achei que ia dar merda.

- Porra.

- Que?

- Primeiro era dar errado. Agora é dar merda.

- Qual a diferença?

- Deixa pra lá.

- Lá vem.

Silêncio.

- Psiu.

- Oi.

- Que foi?

- Nada.

- Nada é o cacete. Você tá puta.

- Tô não.

- Tá sim, te conheço. Tá quieta, tá puta.

- Nem. Tô tranquila. Só aproveitando o momento.

- Que momento?

- Tô aqui registrando mentalmente a primeira vez em que eu estive certa nesse relacionamento. E você errado. Erradíssimo, na verdade. Absolutamente errado.

- Oi?

- É. Só você mesmo pra achar que a gente não ia dar certo.

- Hahahahahaha...

- Óbvio que a gente ia dar certo.

- Você é um gênio, amor.

- Um ano.

- Verdade...

terça-feira, 3 de setembro de 2013

Classificação

Ouviu a porta abrir.

- Amor?

- Oi, amor.

- Quarta-feira. Não marca nada. Vou fazer um cachorro-quente aqui em casa, uns amigos vêm pra cá.

- Boa noite, amor. Como foi o seu dia? Tudo bem no trabalho? Também senti sua falta. Pera. Quarta? Mas quarta tem jogo! Copa do Brasil! Vale classificação, cara.

- Eu sei. Vai passar na TV. Aliás, assinei o PFC pra você.

- Oi?

- Assinei o PFC. Eu sei que você fica puto quando não acha onde ver, especialmente quando nenhum dos seus amigos topa ir naquele bar.

- Ah...

- Aliás, eles já confirmaram quarta-feira.

- Meus amigos?

- Isso. O Paulo, o Beto, o Igor.

- O Igor?

- Aham. E vai trazer a Natália.

- Natália?

- Namorada nova. Uma graça de menina.

- Eu já fiz uma lista de cervejas pra comprar. Tá tudo certo.

- Entendi.

- Tô terminando o jantar aqui. Se quiser tomar um banho antes de comer, tudo bem.

- Tá. É. Boa ideia. Vou tomar um banho.

- Ah. Amor?

- Oi?

- Eu tô grávida.

-...

- Tem sua cerveja favorita na geladeira.