quinta-feira, 3 de setembro de 2009

Liberdade de intrusão

As pessoas estão ficando mais abusadas, isso é um fato. Ninguém se abstém de fazer comentários a estranhos, por mais inapropriados que sejam. Eu mesma, volta e meia, me pego chamando um fulano de porco por ter jogado lixo no chão.

O interessante é que agora as pessoas estão se sentindo mais à vontade para dar lições de moral para os outros, do tipo pra fazer o lugar inteiro se concentrar na existência de um indivíduo que irá, em questão de segundos, lamentar não ter a capacidade de um avestruz, para cavar um buraco no chão e esconder a cara.

Eu já fui uma dessas vítimas, quando, outro dia, um senhor com dificuldade de fala resolveu me cutucar e perguntar se poderia me dizer um negócio. Tolinha, disse que sim. E então ele encheu a boca para dizer que eu deveria mastigar o meu chiclete com a boca mais fechada, porque era mais bonito e que ele já tinha feito muito aquilo quando era novo, blablabla. Em meio à minha vergonha, segurei a língua para não mandá-lo para aquele lugar e perguntar se tinha sido mastigar chiclete de boca aberta que tinha deixado ele falando daquele jeito. Vai que o cara teve um derrame e eu sem a tal capacidade de cavar o buraco no chão, não ia ter como fugir de uma vergonha dessa.

Engoli e fiquei quieta, mas queimando por dentro.

Ontem testemunhei a vergonha alheia.

A pobre gringa, com suas malas e Havaianas, cometeu o erro de se acomodar no banco do metrô e colocar um dos pés, descalços, sobre o banco. Com a cabeça apoiada sobre o joelho, ela conversava com a amiga em algo que eu supus ser russo, mas podia ser qualquer outra língua estranha, até Klingon.

Eu estava entre ela e uma outra mulher, que, ao levantar-se para descer em sua estação, decidiu parar para perguntar à gringa, com toda a simpatia do mundo, qual era o nome dela. Já que eu cismei que a coitada era russa, digamos, a título de ilustração, que ela tenha dito Olga.

E foi então que a mulher descarregou sobre Olga toda a sua fúria quanto ao pé sobre o banco.

- Porque aqui não é a sua casa! Na sua casa, você bota o seu pé no seu sofá! Aqui outra pessoa pode vir a sentar, não é certo você botar o pé num lugar público, em que outras pessoas sentam. E aqui não é a sua casa e nem é o seu país. Então, você tire o pé do banco!

Evidentemente, Olga a ignorou. Em parte porque não deve ter entendido picas do que a louca gritou, mas também porque achou que ela era... bem... louca! Quem é que fica gritando com estranhos assim do nada?

E eu ali, sentada, agradecendo por estar indo para casa, doida por um banho, pensando como se dizia em russo, ou em Klingon, "Desculpe, ela fugiu do Pinel. Aproveite a nossa cidade e volte sempre!".

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