quinta-feira, 27 de setembro de 2012

Vidas cruzadas

Luiz acordou mal humorado aquele dia. Além do time ter perdido na noite anterior, teve o desprazer de descobrir que sua mulher o estava traindo com um colega de bar. Colega, porque não dá pra chamar de amigo um desgraçado que come sua mulher. Mais ainda quando seu time vai mal.

Pegou o uniforme e deixou pra se arrumar no trabalho. Não queria nem ver a cara da vagabunda pra não ter que lhe acertar uma na cara, nem tomar café pra não precisar trocar ideia. Era capaz de falar umas verdades, botar a descarada pra fora de casa, mudar as fechaduras e deixá-la na rua da amargura.

Depois. Depois ele se acertava com ela.

Mas ele já sabia que seria um daqueles dias. Com aquele tanto de gente burra fazendo sinal pro ônibus só pra perguntar se passava na rua tal, ou se fazia aquele ou outro caminho. Ele era pago pra dirigir, não pra prestar serviço de informação pra gente perdida. Pesquisasse antes o trajeto da linha, oras! Eu, hein.

Fora as malditas ruas em obra. Período de eleição é sempre a mesma porcaria, com candidato querendo mostrar trabalho e ferrando a vida das pessoas. E as obras ficavam mudando os pontos de lugar, além de transformar cada viagem num rali dos sertões. Inferno.

Já eram quase sete da noite. Luiz já não aguentava mais dirigir e só pensava em ir pro bar. Não o mesmo de sempre, pra não ter que encontrar aquele traíra e segurar a vontade de lavar sua honra com o sangue de um murro bem dado na cara do infeliz. Um novo, onde ele fosse um desconhecido precisando de uma gelada pra afogar as mágoas.

Faltava pouco, era a última viagem. Dali, direto pra garagem. E tantos ônibus querendo parar justo naquele ponto do lado do tapume. Maldita obra. Maldito ponto que ficava ali atrás. Luiz decidiu seguir por fora. Pulou aquela parada.

Afinal, que mal faria?

Lídia se organizou direitinho naquele dia. Já sabia que precisaria tirar a sexta de folga pra resolver algumas coisas, e aquele era dia de aula longe, precisaria sair mais cedo do trabalho. Por isso montou todo um cronograma com suas horas na semana e distribuiu aquelas que pegaria pra si pelos outros dias. Assim ninguém poderia falar nada.

Já estava tudo certo. Bilhete único recarregado, pesquisou no Google todas as opções para sair do escritório e chegar no lugar onde aconteceria a palestra, escolheu a mais familiar. Parecia fácil.

Chegou cedo pra trabalhar, almoçou rápido e saiu antes da hora, explicando direitinho o motivo.

Daria tempo.

Pegou o primeiro ônibus, desceu no ponto recomendado, decidiu escutar música enquanto esperava o segundo.

Que fome. Talvez ela devesse ter comido antes. Tudo bem, ela podia comer quando chegasse. Olhou o relógio. Tinha tempo de sobra.

Passaram 3 carros. O número parecia ser aquele. Na dúvida, fez sinal. Perguntou ao motorista. Não, aquele número não ia praquele lugar.

Será que tinha errado?

Não. era aquele número, mas a letra era diferente. Lá vinha o ônibus! Isso! Ela ia conseguir.

Ei! Não, moço. Não vai por fora! Por favor! Moço, para no ponto! Ela não sabia que outros ônibus pegar! Aquele já tinha demorado tanto, não daria pra esperar o próximo.

Olhou a carteira pra ter certeza. Só tinha dinheiro pra volta. Não daria tempo.

Lidia viu de longe seu banco. Do outro lado, um ponto de táxi. Cruzou a avenida pra tirar dinheiro. Não poderia gastar tanto.

Pegou o táxi. Chegou a tempo. Conseguiu até comer uns salgados antes da aula começar. Pelo menos economizou no jantar.

Luiz chegou no bar do lado da garagem e bebeu todas. Foi pra casa cheio de coragem pra reclamar sua masculinidade de volta.

Chegou pra achar tudo escuro, menos a cozinha, um bilhete em cima da mesa.

"Cansei. Fui embora com o Zezão. Tem carne assada na geladeira."

Maldita.



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