quarta-feira, 6 de agosto de 2014

Decoração

- Amor, tava aqui pensando. A gente bem podia pendurar uns quadros, né?

- Tipo agora?

- Sim, agora.

- Que quadros?

- Aqueles pequenininhos que a minha irmã me deu, dos Beatles.

- Aham. Tá. Em que ordem você quer pendurar?

- John, Paul, George, Ringo.

- Sério?

- Sim, por que? Você penduraria diferente?

- Qual a ordem do Abbey Road?

- Sério?

- Anda, pesquisa.

- John na frente, Ringo, Paul, George. Mas se for assim eu prefiro a ordem do Sgt. Pepper. Gente!!!

- Que?

- É a mesma ordem. Só que da esquerda pra direita. Será que é sempre essa ordem?

- Eu não vou ficar conferindo todas as capas de disco agora.

- Tá, mas eu não quero a ordem do Abbey Road. As pessoas vão chegar aqui e pensar que é o nosso disco favorito.

- Mas é o meu disco favorito, Diana.

- Você não mora sozinho, Paulo.

- Tanto faz, não é como se a gente recebesse visita mesmo.

- Como é que a gente vai receber visita com essa casa? Se pelo menos tivesse uns quadros na parede...

- Tá, entendi. Vamos pendurar essa merda. Em linha? Ou tipo dois em cima, dois embaixo?

- Reto eu não acho boa ideia.

- Por que?

- Porque você não consegue colocar nada alinhado com nada.

- HEIN?

- Você realmente quer voltar à discussão da televisão?

- O que você sugere, então, Diana?

- Pendurar tudo meio loucão e a gente finge que é estilo. Um pra cá, outro pra cimão, outro bem pra baixo e assim vai.

- Loucão?

- Sim, mas equidistante.

- Então não é loucão.

- Mede, Paulo. Toma prego e martelo.

- Aqui?

- Pra baixo só meio milímetro.

- MEIO milímetro?

- Aí.

Martela martela martela martela.

- Ficou bom?

- Ai, que lindo. A gente tem quadros na parede. Amei. Agora outro.

- Aqui?

- Mais pra esquerda. Um pouco mais. Um pooooo... AÍ! Só mais pra baixo um dedo. AÍ!

- Posso martelar?

- Aham.

Martela martela martela martela.

- Gente, que emoção! Dois quadros.

- Vamos logo, Diana. Eu quero ver o jogo.

- Aff. Tá.

Martela martela martela martela martela martela martela martela.

- Pronto, né?

- Sabe o que eu pensei, amor? Que a gente podia aproveitar e pendurar aqueles seus quadros.

- Quais?

- Os que eu te dei de aniversário de namoro 2 anos atrás.

- Sutil, Diana. Sutil.

- Eu me esforço.

- Tá, pega lá os quadros.

- Já estão aqui.

- Aposto que você tem uma sugestão loucona de como pendurar, né?

- Na verdade, eu pensei que a gente pode encaixar aqui entre esse e esse e o outro bem aqui, ó.

- Hmmm...

- Que foi? Não?

- Não. Pior que ficou bom. Gostei. Tem um conceito.

- Claro que tem um conceito. Eu sou toda conceito. Conceito puro.

- Menos. Dá outro prego.

Martela martela martela martela martela martela martela martela.

- Gente! Que coisa LINDA!

- Tá bom? Gostou? Posso ver o jogo?

- Pode. Deixa só eu tirar... uma... foto... pera... tô postando no Instagram. Pronto! Lindo. Quer uma cerveja, amor?

- Boa. Deixa eu até curtir sua foto, né, senão já viu. Olha! Minha mãe comentou. Quer visitar, ver a decoração de perto.

- Hmmm...

- Você que disse que a gente poderia receber visitas. Minha mãe é visita, né?

- Sabe, a gente podia primeiro botar aquela prateleira, né? Se ela vier aqui agora vai ficar reparando que a gente tem pouca coisa, vai achar que a gente é pobre, tá passando necessidade, que você devia ter ficado na casa dela e...

- Respira, Diana.

- Hum.

- Que?

- Acabei de notar que essa ordem tá parecendo com a capa do Revolver.

- E?

- Eu tenho péssimas memórias desse disco.

- Quer que eu desconverse?

- Por favorzinho?

- Posso deixar os quadros assim?

- Aham.

- Tá. Pega a cerveja?

- Te amo.


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