Antonia decidiu ir pro curso só pra ver se aquilo tiraria seu pensamento de Fred.
Obviamente, não deu certo. Aquele lugar, aquelas pessoas a faziam sentir-se estúpida. Assim como ele.
Ela não tinha as referências certas, não conhecia nenhum daqueles artistas, obras, intervenções, instalações ou qualquer que fosse o nome certo daquilo. Ela não entendia todas as conexões que seus colegas faziam quando viam uma porcaria de um risco na parede.
Talvez tivesse sido péssima ideia ir a aula em vez de simplesmente sentar num bar, encher a cara e flertar com qualquer um. Ela só precisava parar de pensar nele.
Tentou focar em algo que fizesse parte de seu mundo não artístico. Ponto de vista. Olhar pra alguma coisa ou alguém de outro jeito.
Como ele. Ela precisava parar de inventar pra si mesma que Fred era seu grande amor, que um dia ele perceberia isso, que ele só precisava de um pouco de tanto faz o que.
Lá estavam eles de novo falando de performances, de uma moça que havia convocado pessoas aleatórias a se desfazerem de objetos que lembrassem ex-amores e jogar tudo em uma caçamba de lixo. Riram do que foi levado. Um disco do Raça Negra. Quem dava disco do Raça Negra pra uma namorada?
Antonia gostava de Raça Negra. Suas músicas sempre fizeram sentido pra ela naqueles momentos em que precisou de consolo.
Mas ela não entendia de arte, talvez não entendesse de música também.
Quarenta minutos de cara de paisagem até a hora de ir embora. Foram todos juntos a caminho do ponto e ela ficou feliz por ser a única a ir pro lado oposto. A caminhada até o metrô seria suficiente pra reorganizar a cabeça.
Outro ponto de vista.
Qualquer coisa que a fizesse aceitar, de uma vez por todas, o quanto Fred a estava usando. Falava de amor pra continuar tendo sexo vez ou outra. Ela não era especial, apenas mais disponível que as outras.
De longe percebeu um homem se aproximando. Carregava uma sacola nas costas, provavelmente cheia de latinhas, que fazia muito barulho. Começou a reparar o ritmo do metal batendo, de como tudo harmonizava com seus passos. Só quando ele chegou bem perto entendeu que era um morador de rua já de certa idade. Ele cantava.
"Você jogou fora.."
Antonia sempre gostou de Raça Negra. E de como suas músicas sempre fizeram sentido.
Ela sorriu um meio sorriso desolado.
Era tarde demais.
Que pena.
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